12.8.06

O SUICÍDIO COM FINALIDADES POLÍTICAS (MINHA TERCEIRA SEÇÃO NO A.S.A.) - Infelizmente não consegui evitar o pior diálogo de todos os tempos. "Você decidiu?" "Ah, pensei muito." "E então?" "Eu fico com o menino [normal]. A menina [com Sindrome de Down] eu não quero" [Ao fundo, toca a canção: "Eugenia, eugenia, eugenia eu estou aqui!"] "Mas como assim!? Você tem noção do que está dizendo?" [Ela é Ongueira Duarte, reencarnação carioca de Madre Teresa, a futura Nobel da Paz, o Bem mais puro!] "Olha, eu escuto coisas muito piores onde trabalho." [Mesa branca com Hitler e Stalin ou seção de terapia com o Khmer Vermelho? Ainda não consegui me decidir] "Eu faço mais de 150 partos por mês e vejo que as mulheres nem sempre quiseram ter seus filhos! A gravidez nem sempre é desejada, nem sempre vem no tempo certo! Mas pense nas crianças, pense pelo menos em uma graça de Deus!" [imagine o escândalo que ela não fez na Candelária! Conversando com o Cão encarnado, não se chega muito longe com esse argumento] "Eu trabalho muito e Deus [leia-se: o Capeta. Ela está querendo dar uma disfarçada] sabe o quanto lutei para que minha filha fosse estudar no exterior. Ela sabia que tinha posto a perder todo o meu investimento. Se eu estivesse lá, ela teria abortado." [com linha de tricô, porque um citotequezinho ou mesmo uma rainha do vodu do Suriname nessas condições não valeriam o capital] "Por favor, fale com a irmã X. e saia da minha sala." "Com licença."
É pedir demais representar um pouquinho só de hipocrisia?
Enquanto eu escutava esse diálogo, pensei na possibilidade de subir no parapeito da minha janela e começar a barganhar minha vida pelo fim imediato da novela. Hoje eu percebi que eu preciso usar minha tendência suicida para o bem do coletivo. Esse diálogo não foi apenas um diálogo ruim, o pior que já ouvi na minha vida em termos de construção de caracteres e drama. Esse diálogo tem má fé. Ele é o atestado de insanidade mental de gerações, é a prova de que em 1945 os norte-americanos poderiam ter feito no Japão coisa muito pior do que teste atômico, é a evidência de que o Apocalipse começa no Projac e nem precisou de Pedro Bial para tocar a primeira trombeta. Enquanto eu assistia a esse diálogo, observei o semblante compenetrado de duas mulheres que davam crivo àquela cena e me chamaram de louco por ter ousado criticá-la. "E não é verdade?" Eu não sei se vou conseguir voltar a participar de nossas seções depois do que vi em Páginas da Vida. Se o suicídio é a única alternativa que me resta em um país que vive à sombra de Manoel Carlos, preciso utilizá-lo com algum fim político. Será que minhas ameaças de suicídio em horário nobre venceriam os índices da novela. Será?
Eu tentei ficar longe daquilo durante uma semana. Mas é impossível ignorá-la. É como ser negligente diante de algum holocausto dividido em quatro blocos separados por comerciais.
***
Eu queria ser uma Katiúcha para em seu límpido aquário mergulhar.

O SUICÍDIO COM FINALIDADES POLÍTICAS (MINHA TERCEIRA SEÇÃO NO A.S.A.) - Infelizmente não consegui evitar o pior diálogo de todos os tempos. "Você decidiu?" "Ah, pensei muito." "E então?" "Eu fico com o menino [normal]. A menina [com Sindrome de Down] eu não quero" [Ao fundo, toca a canção: "Eugenia, eugenia, eugenia eu estou aqui!"] "Mas como assim!? Você tem noção do que está dizendo?" [Ela é Ongueira Duarte, reencarnação carioca de Madre Teresa, a futura Nobel da Paz, o Bem mais puro!] "Olha, eu escuto coisas muito piores onde trabalho." [Mesa branca com Hitler e Stalin ou seção de terapia com o Khmer Vermelho? Ainda não consegui me decidir] "Eu faço mais de 150 partos por mês e vejo que as mulheres nem sempre quiseram ter seus filhos! A gravidez nem sempre é desejada, nem sempre vem no tempo certo! Mas pense nas crianças, pense pelo menos em uma graça de Deus!" [imagine o escândalo que ela não fez na Candelária! Conversando com o Cão encarnado, não se chega muito longe com esse argumento] "Eu trabalho muito e Deus [leia-se: o Capeta. Ela está querendo dar uma disfarçada] sabe o quanto lutei para que minha filha fosse estudar no exterior. Ela sabia que tinha posto a perder todo o meu investimento. Se eu estivesse lá, ela teria abortado." [com linha de tricô, porque um citotequezinho ou mesmo uma rainha do vodu do Suriname nessas condições não valeriam o capital] "Por favor, fale com a irmã X. e saia da minha sala." "Com licença."
É pedir demais representar um pouquinho só de hipocrisia?
Enquanto eu escutava esse diálogo, pensei na possibilidade de subir no parapeito da minha janela e começar a barganhar minha vida pelo fim imediato da novela. Hoje eu percebi que eu preciso usar minha tendência suicida para o bem do coletivo. Esse diálogo não foi apenas um diálogo ruim, o pior que já ouvi na minha vida em termos de construção de caracteres e drama. Esse diálogo tem má fé. Ele é o atestado de insanidade mental de gerações, é a prova de que em 1945 os norte-americanos poderiam ter feito no Japão coisa muito pior do que teste atômico, é a evidência de que o Apocalipse começa no Projac e nem precisou de Pedro Bial para tocar a primeira trombeta. Enquanto eu assistia a esse diálogo, observei o semblante compenetrado de duas mulheres que davam crivo àquela cena e me chamaram de louco por ter ousado criticá-la. "E não é verdade?" Eu não sei se vou conseguir voltar a participar de nossas seções depois do que vi em Páginas da Vida. Se o suicídio é a única alternativa que me resta em um país que vive à sombra de Manoel Carlos, preciso utilizá-lo com algum fim político. Será que minhas ameaças de suicídio em horário nobre venceriam os índices da novela. Será?
Eu tentei ficar longe daquilo durante uma semana. Mas é impossível ignorá-la. É como ser negligente diante de algum holocausto dividido em quatro blocos separados por comerciais.
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Eu queria ser uma Katiúcha para em seu límpido aquário mergulhar.